quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Por que não há rimas para o teu nome



Escreverei
antes que este dia acabe
um poema sobre teu nome
que ainda sim, não impedirá em breve, o doce fim do mundo

Escreverei
antes que este dia acabe
teu nome, diversas vezes, em um poema
que, este sim, interferirá no balé dos astros e constelações
fazendo surgir assim um novo e 13º signo

Escreverei então
um poema sobre teu nome
todos os dias
com o afinco de valentão centroavante exímio
ao celebrar gol chorado nos estertores do 2º tempo

Escreverei, diversas vezes
todos os dias
teu nome em um poema
que findado, não caberá inteiro
rabiscado sobre o Trópico de Capricórnio

Escreverei, um dia
em todos os meus poemas
teu nome
após passar noites em claro
decifrando rimas e palavras perdidas
em dialetos mortos

Escreverei, um dia
um poema sem rimas sobre
teu nome
que atravessará o Atlântico
e será compreendido pelos bantos congoleses
em sua ancestral espiritualidade
como o grito primal de seus deuses do mar

Escreverei, um dia
todas as rimas de teu nome em
um poema
silencioso como um tigre, felino em riste
sob à espreita na escuridão
abissal da floresta

Um dia, não escreverei mais
pois finalmente, todos os meus poemas
serão somente
teu nome

terça-feira, 23 de outubro de 2012

São Jorge terça-feira 23 # parte IV



hoje 21h15

bom nos encontrarmos. como anda a vida? - me perguntou são jorge, sentado no balanço da mangueira.
_ frágil. na corda bamba. sempre é um novo recomeço, é toda uma reviravolta.

_ esse lugar é legal. casa verde. bonita. combina com o nome.  
_ também acho. 
_ anda escrevendo?
_ um pouco. há sempre uma necessidade desse ritual. é como um vício, um prazer.  
_ e escrevendo sobre o que? 
_ sobre muitas coisas. venho deixando o fluxo tomar conta da escrita, uma linha fina esticada entre uma idéia e perdida entre nenhum ponto à frente. minha intenção é  escrever um romance. algo realmente que eu possa entrelaçar destinos, definir tragédias. 
_ interessante
_ você devia me ajudar. 
_ como eu poderia?
_ conhece tantas histórias, já esteve em tantos lugares e viu tantas coisas acontecerem. talvez me conte uma tão boa que me desperte uma grande inspiração. já estou cansado de escrever sobre mim e sobre o que conheço tão bem.
_ histórias existem aos montes, saber contá-las é que são elas. 
_ não quero histórias, quero uma estória. quero um segredo mortal, uma grande trapaça ou uma tremenda emboscada. quero saber de algo tão engraçado que eu role de rir. quero a pior desgraça que puder me contar. 
nesse momento, são jorge me olhou sério.
_ cuidado com o que pede, meu rapaz. 
vi que ele havia ficado abalado com minha proposta.
te desafio a contar a mais desgraçada e trágica estória que puder.
_ não conseguirá suportar. 
_ não me subestime.
são jorge abaixa a cabeça e sua feição se fecha, demonstrando consternação. percebi então ter tocado em tremendas lembranças com certeza muito doloridas e que lhe devia respeito e desculpas.
olhe, não se preocupe com isso, esqueça. falemos de outro assunto. da vida. do futebol. de música. do amor. rssss
são jorge continuou olhando para seus pés
as desgraças a  que se refere. as tremendas tragédias, que busca encontrar e saber, todas elas, foram em certo momento, histórias de amor. o amor é tão maravilhoso, e por assim ser, tão volúvel, que muito facilmente se liquemorfa em  gás lacrimogêneo, soda cáustica e excremento na ponta da bota. 
não pude deixar de concordar, em certo sentido, com o que ele dizia.
veja bem robisson, lhe contarei uma estória, ela aconteceu na frança por volta de 1920. havia um homem em paris, se chamava amadeo. era pintor. um bom pintor. pintava aquarelas muito vivas e iluminadas, influenciado por cézanne e picasso, chegou mesmo a travar encontros com esses e outros pintores, qua admirava.
amadeo vivia na parte sul de paris num casebre, que fora de seus avós; imigrantes tunisianos, e depois que fora de seus pais e agora dele. sua única irmã, mais velha, morava do outro lado da cidade e os dois pouco se viam. amadeo não tinha parentes em paris. e não havia família em lugar algum. tios primos sobrinhos. não havia família para amadeo, simplesmente não existia. a tunisia era um país destruído pela guerra civil, destroçado em sua árvore genealógica. quantas pessoas tiveram e mudaram de nome, em seus novos países, aos se instalarem, fugindo da guerra? ah as guerras,  destroem demais. 
aos 30 e poucos anos, amadeo sobrevive da venda; aos amigos simonn e vylova, da pequena horta que cultiva em sua propriedade, e dos quadros que pinta. lhe sobra tempo razoável em seu dia pra o trabalho na horta, para a pintura e os afazeres domésticos e de conserto de sua velha casa de taipas e andaimes.  vive razoavelmente bem, em sua luta diária pela sobrevivência. 
- sim?
_ pois bem, muitas vezes as enormes mazelas que a solidão nos propicia, refletem na sua alma e quanto mais vasto e desértico seja seu coração, mais desventuras esse homem terá. 
_ mas você não disse que o amor é um veneno, agora mesmo?
_ sim, mas não estou dizendo sobre o amor, somente, mas sobre a profundidade que estão cravadas seus medos dentro do seu coração. há corações que temem tanto o mundo e o desafio da vida, que se tornam tão maus quanto puderem, buscando contra atacar e aplacar o vácuo que o medo provoca. a paralisia, a estática. nunca aprenderão a amar verdadeiramente, no máximo se relacionarão com outros homens e mulheres pela vida afora, e só. 
 entendo. 
_ e amadeo era um homem com um coração profundamente solitário. freqüentava bordeis sujos, e se humilhava pedindo afagos. trôpego, quase sempre era escorraçado dos ambientes, e visto amanhecendo dormindo nas calçadas, sob as marquises das lojas. não tinha amigos e todos se acostumaram com essa realidade. viciado em morfina adquiriu, antes dos 30 anos, uma tuberculose crônica e uma febre vaporosa que o cobria de tempos em tempos, o deixando acamado e aos cuidados dos seus únicos amigos, o casal de judeus simonn e vylova, que talvez, se não fossem seus patrões, assim digamos, não se incomodariam em deixá-lo à própria sorte.
_ um grande artista bêbado?
_ um homem com uma dor. 
_ entendo.
_ apesar de todas essas complicações financeiras e de saúde, amadeo gozava de certo prestígio e reconhecimento da sociedade que lhe acolhia sendo o filho de zlavoc, o marceneiro, como era chamado seu pai. ao perceber que amadeo  tinha vocações para as artes, zlavoc não quis que seu filho dedicasse tempo ao desenho e a pintura, e o sobrecarregava nas tarefas pesadas diárias. somente com a morte do pai, é que amadeo pôde se dedicar a pintura como profissão. levando sua vida solitária e desregrada, porém batalhadora e honesta aos olhos de seu círculo social, amadeo ainda era considerado um rapaz que tinha salvação e rumo. e um buchicho ao seu redor, na boca principalmente das moças, foi crescendo e fantasiando a lenda de que era moço rebelde e que só sossegaria, quanto encontrasse uma esposa e formasse uma família. 
conhece uma jovem artista, então com 19 anos, Joanne, pintora como ele. moça tida como tímida, mas de olhos insinuantes à emoldurar seus silêncios. muito pobre, joanne se submeteu primeiro a posar para amadeo por uma pequena quantia de dinheiro e algumas frutas secas. logo em seguida, depois de alguns dias e alguns quadros produzidos e já na provocação da intimidade, acertaram que não haveria mais pagamento, pois assim não estaria correto, eram enfim amantes e joanne se mudou para sua casa, no fim de poucos dias.  
_ se casaram?
_ sim, mas não sem antes uma grande conturbação, para a época, os envolver.
amadeo pinta joanne nua. expõe seu quadro numa galeria e a apresenta como sua modelo, musa e futura esposa. para os carolas da época e as senhoras e fino trato da sociedade francesa, era um absurdo uma mulher posar nua, para o marido a pintar e expor daquela forma. isso era papel guardado às prostitutas e mulheres de baixo calão. amadeo alardeia certa fama após a exposição e joanne que tinha grande talento, passa a viver a sombra de amadeo, produzindo suas telas por hobbie, em casa e sem motivação. 
nos anos seguintes a vida segue dura e produtiva. o casal tem um filho e a situação financeira melhora razoavelmente. mas, com a frágil bonança que adquiriram, cresce em amadeo os vícios carnais e o mau caratismo. começa a jogar e a viver constantemente na zona boêmia parisiense, pintando agora os dorsos nus das jovens concubinas francesas em seus próprios leitos cheirando a sexo, e aceitando trabalhos de gigolôs para que transmitisse a beleza de suas mulheres, para o deleite dos clientes, em enormes telas que emolduravam os grandes salões dos bordéis mais freqüentados da cidade. vendia suas telas e sua arte puramente para pagar dívidas e dívidas, contraídas em apostas e noitadas infernais. nessa época, sua tuberculose piora e o vício em morfina e ópio o torna mais irritadiço e delirante. já não consegue se movimentar sozinho e tem crises tremendas de tosse.
_ meu deus. 
_ aos poucos, a família se desestrutura e vai à ruína. enclausurados dentro de sua própria casa, agora joanne espera o segundo filho do casal. amadeo vende seus pertences, e até ferramentas de estúdio e trabalho, para comprar comida. se alimentam de batatas e lingüiças velhas. passam dias isolados do mundo, tão fracos que não conseguiam chamar ajuda. são encontrados por simonn, sujos, famintos e desidratados. joanne está delirando e amadeo não consegue pronunciar uma palavara, devido ao estado de inanição. ambos são internados na casa de saúde, joanne está prestes a dar a luz e a qualquer hora pode entrar em trabalho de parto.
a noticia corre a cidade e as obras do pintor odiado por sua bela arte, por seus nus, sofre uma valorização enorme. nas casas de prostituição, terços são rezados pela sua saúde, outros pela sua alma. 
 _ meu deus, e esse amadeo vez sucesso? nunca ouvi falar?
_ o sucesso não importa, meu amigo. ele não foi feliz. o sucesso, que se acredita que ele teve, com toda a certeza, trocaria por uma serenidade verdadeira em sua vida.
_ sim.
_ amadeo morre numa manhã, sozinho como viveu a vida, no quarto 17 da casa de saúde. joanne recebe a triste notícia, visita em silêncio amadeo, e lhe deixa uma mecha de seu cabelo negro. no dia seguinte, grávida, se atira da janela do seu quarto. 
_ putz. 
_ por ter suicidado, o padre não quis realizar o enterro, e sem família seu corpo não foi reclamado, e permaneceu exposto sob o sol, enegrecendo a pele, antes alva e linda.
um homem recolheu o cadáver de joanne e o levou ao sr. simonn, que aterrorizado o mandou embora. joanne foi atirada na beira do rio, onde os urubus e pequenos abutres que rondam as estrebarias de paris, devoraram suas vísceras, e onde depois sua carcaça, com seu filho na barriga, apodreceu entre as flores e a grama verde, por muitos dias ainda, e se misturou ao solo pela eternidade adiante. amadeo foi enterrado nu, em uma cova rasa do cemitério da casa de saúde. 
são jorge me olhou nos olhos, como sempre fazia, quando dizíamos algo realmente importante. e eu disse …
_ e o amor, jorge? 
_ foi morto. 
_ por eles?
_ não. por nós. 
_ como assim?
_ não conhece essa história?
_ não
_ pois então. se familiarize. ela é a sua.
_ claro que não é minha. é muito triste. é uma história desgraçada. por isso nunca gostei de dizer essa palavra.
_ faz bem em não dizê-la. não digo que é, ou será a sua história, mas que é a sua história, por que pode acontecer com qualquer um. amor e loucura são faces da mesma moeda, meu amigo. mataram o amor muitas vezes na vida desse homem, amadeo. não foi o amor de sua mulher que o matou, esse eles viveram, o quanto puderam. foi o amor próprio. fizeram desse homem fantástico, um artista sensível e inteligente, um bicho, o tiraram a dignidade e o deram um pedaço de carne podre para comer como um cão do infernos. esse homem, robisson, foi um dos muitos homens que caminham mortos sobre a terra, todos os dias. 
realmente a historia era triste, talvez não a mais triste estória que exista, mas bastante trágica.
_ será que ajudei você? a te inspirar para seu novo livro?
_ sim. acredito que sim
_ que bom. 
_ robisson?
_ diga. 
_ aceita uma manga? - e uma linda fruta verde e rosa caí, exatamente, nas mãos do santo -não sei apenas contar boas estórias. já fui moleque também,, sei como trepar em árvore e pegar fruta no pé. rsss
_ entendi, e por que não subiu e pegou ao invés de transportar a manga pra tua mão?
_ se esqueceu, ¨para os poetas algumas coisas são bem complicadas, e outras muito fáceis¨. 
se movimentou no balanço, rindo.

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

o rio de rimbaud




pingo
cor
e
lírio

nos
olhos
e
olho

o
Rio
e
rio

"e
também
posso
chorar"

mas

sou

risos
e
rios

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Mensagens do Front : São Paulo



Pela manhã ao acordar, nos demos um poema de bom dia e espreguiçamos. Gosto muito do jeito que ela têm, logo pela manhã, já sorrindo com os olhos. Eu geralmente acordo como se tivesse saído da Batalha de Waterloo.

Levantou-se da cama, foi escovar os poemas no banheiro e se banhar. Fazia frio e o barulho dos poemas caindo do chuveiro, me fizeram querer poder dormir mais.

Abri a janela, e mesmo a contragosto, acendi um poema olhando a cidade, sua fumaça fazendo ziguezague e entrando pelo meu apartamento. No horizonte, até onde a vista alcança, na rotina da minha cidade, o que se vê são poemas de vários andares.

Poemas, poemas e mais poemas.
E em cada um deles, tantas vidas, tantas pessoas.

_ Amor _ ela sai do banho _ Lá no seu trabalho seus colegas não perguntam se nós não vamos ter um poema ?

_ Perguntam. Até já pensei no nome dele.



sexta-feira, 6 de julho de 2012

Música



ela é mais forte que você
ela se impõe ela se instaura e te eleva
renega tua face cotidiana e te liberta solitariamente
pelas esquinas, nos pontos de ônibus
ou em frente à lojas de conveniência
move o ar à sua volta e negocia vácuos na retidão da nossa tola seriedade
não importa quem você seja ou seja qual a música
ela é um deus secreto e sacana
a música ruge, range e reza
a música dói, machuca e fere
a música ri, masturba e gargalha
a música ilude, ilumina e inaugura
a música longe
a música love
a música leve
a música da art naif
a música
a sua música
aquela música
a nossa música

"lembra?"