quarta-feira, 30 de julho de 2008

Éramos negrões fudidos e oprimidos do Sul dos Estados Unidos em 1920




Gravar um disco mais que escrever um livro, é único e fugaz
O livro tá na cuca, na imaginação
As palavras grafadas pra sempre no papel

E ninguém a não ser você as lê
interpreta
imagina
decifra e cria
tudo no silêncio, no livro o silêncio é a única coisa que existiu

sabe como é

Agora a música tá na fala, na boca, na voz
Tá viva do teu lado te roçando os calcanhares
Gravou uma vez, é aquilo

E aí já era

19 e 20 de julho de 2008

dias de
nossas vidas
daqui a eternidade
dos mais importantes

vou guardar a camiseta amarela toda furada que usei
como troféu
guardá-la como torcedor apaixonado que pega em meio à multidão, na derrota por goleada pro rival, a luva do goleiro peruzeiro
e que pensa caminhando para casa, fazendo figa e apertando o amuleto

_ Próxima rodada vamos ganhar !!!

No estúdio, umas horas a música sangrava um pouquinho

Ia lá e ...
água borricada mertiolate assoprava e continuava

apagava as luzes na cabeça e via toda a minha vida

o que fiz e o que quero fazer

madrugada, bar, cigarro, samba, cervejas, beijo, drogas, amigos, encontros despedidas, rodoviária, ônibus, táxi, prostitutas, hotel, estúdio, banho, cama, sono

sonho nº 1
o ar tocava um sax numa boite em Massachusetis (falado pelo Mussum, que por sinal também estava lá)

cheiro de conhaque no bar, muito
depois da última apreensão, bourboun e vinho eram difíceis de encontrar

nós éramos a banda do lugar
e tocávamos só pra ganhar uns goles no butiquim
éramos negrões fudidos e oprimidos do Sul dos Estados Unidos em 1920
zero estrelas do rocknroll
sabíamos que íamos e poderíamos morrer a qualquer momento, tanto nós quanto nossos velhos pais negros de cabelos brancos e nossas filhas e filhos negros, crianças ou adolescentes
e qualquer um de nossos amigos negros como nós
afinal, éramos negrões fudidos e oprimidos do Sul dos Estados Unidos em 1920

tocávamos e as almas escorriam pelo salão

pessoas sentiam tão fortemente aquela música que uns tinham muita vontade de se masturbar

eu tinha cicatrizes no rosto uma voz tonitruante e roufenha
tocava banjo
B. media dois metros, tinha costeletas e ainda se chamava B.
Leôncio era Jonhson e tocava baixolão com mãos enormes

Nossa banda era Susie & The Heart’s Mopho

Aline era Susie, uma crioula de bunda enorme, e nós a acompanhávamos ocasionalmente em seus delírios de soul
Amávamos o jazz e o blues, éramos todos filhos de lavradores e havíamos freqüentado as igrejas gospels em nossas cidades

Uma lenda dizia que Jerry Lee espancava seu piano sob influencia de nosso guitarrista e pianista Antonys
E ainda havia Kidopoulos nas vassourinhas, preto como o petróleo e amante das atrizes de vaudeville

Éramos um bando de desgraçados impetuosos

Depois de dois intervalos e várias improvisações, em meio a um gole de Vermouth, ouvi meu verdadeiro nome sendo dito e acordei

Susie já de banho tomado me despertava
Era hora de levantar pegar um táxi e ir pro estúdio no Setor Leste da capital do Estado de Goiás

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29 de julho de 2008

3 comentários:

Unknown disse...

Oi Robisson!

Então, hoje acordei e me lembrei dos "negrões fudidos e oprimidos do Sul dos Estados Unidos em 1920" que você me "disse" ontem no orkut, vim aqui conferir.
Li algumas (muitas) vezes hehe

Meu primo, Leon, já havia me antecipado alguma coisa sobre as gravações em goiania e agora lendo o que você escreveu minha curiosidade aumentou :)

Bem, é isso.Eu poderia escrever muita coisa aqui, mas acho que comentários muito longos podem parecer cansativos.

beijos

e para Maitê disse...

- Cheguei até a imaginar o bar, o som os cigarros...E vi a moça, e os negrões com sua belas vozes, e o Jazz suavizando uma noite desvairada...Parecia até que estava lá, olhando tudo num canto de alguma parede.

Cecília Borges disse...

deu pra imaginar,
quase ouvir o mesmo
blues, o mesmo jazz
deles

um bj!