quarta-feira, 19 de setembro de 2007

TIMES NEW ROMAN




eu
adoro
as palavras
tão bonitas
em seus contornos e reentrâncias
poderia lê-las e tocá-las por horas a fio
e quando, literalmente as cantasse
e alguma fosse, com minha cara, com a minha cara
poderíamos ter um caso
transar a noite toda
&
formarmos,
eu e uma linda palavra,
famílias de proparoxítonas
e passaríamos tardes inteiras passeando em cadernos de caligrafia
imaginando como deveria ser chato morar num livro ou num dicionário
e nunca se aproximar
da língua de ninguém



eu
passeando pelas frases encontrei um sujeito
ele
e minha vida se encheu de verbos
sonhar, sentir
tocar, trair
o substantivo nunca foi insubstituível
você
alguém
ninguém
pois o tempo
o tempo só não destrói as palavras

nós adoramos as palavras
como estas ... cantadas, impressas
na página
que
você eu nós
lê leio lemos

Esse fim de semana, 14,15 e 16 de setembro, aconteceu o Festival Jambolada aqui em UberCity, três dias de rock com várias das mais bacanas bandas de rock do cenário independente nacional. Nós da Juanna Barbêra tocamos no primeiro dia, sexta. Nos dias anteriores, ansiedade, frio na barriga, você se percebendo rindo sozinho em lugares públicos em plena luz do dia movimentado, a imaginação criando shows, escutando já os acordes das músicas e o barulho da multidão. Um show é sempre celebração, incesto coletivo, é quando transamos conosco, com os olhos arregalados do público a nos observar. O show, o espetáculo é a completa exposição, todos vêem sua bunda branca, mesmo que estejam na última fila.

A Juanna Barbêra iria tocar antes do Tom Zé, mas atrasos na montagem e passagem do som e na chegada do próprio Tom Zé fizeram com que a organização nos passasse pra depois dele e depois de nós havia outras quatro bandas, Los Porongas, Vanguart, Porcas Borboletas e Daniel Belleza e os Corações em Fúria nessa ordem. O atraso fez com que os shows de todas as bandas ficassem mais curtos, o que também aparentemente não incomodou a ninguém, a não ser, com razão, o Daniel Belleza, que entrou no palco às 5 da manhã e por motivos de contrato com a casa os organizadores tiveram de interromper seu show antes o final.

O público lota a pista da casa de espetáculos Acrópole, a morada dos deuses na mitologia, para assistir ao ídolo Tom Zé, que entra com o rosto pintado com motivos indígenas, ao que me parece, e logo no início; visivelmente irritado com uma pessoa na platéia ou com toda a platéia, convida um sujeito para cantar em seu lugar, já que, pelo que entendi, o cidadão estava pedindo aos gritos uma música com insistência, ao menos aos olhos e principalmente ouvidos do Tom Zé.
O rapaz então cantou desafinado e chapado “Fliperama”; acho que esse é o nome da música, e a galera vaiou. Esse mesmo sujeito foi o que, segundo nos disseram, no fim do nosso show praticamente destruiu nossa máquina de escrever Olivetti que usamos na performance tocando justamente essa música, Times New Roman. Uma pena porque era relíquia do vovô, mas a gente descola outra.

Nisso fomos pro camarim. De lá ouvíamos a música, o público, sem nos atermos aos detalhes e ao que acontecia. Subimos no palco e fizemos o nosso show para um público bacana, sorrisos no rosto, gente dançado e batendo palma, flashs de fotos sendo tiradas e uns poucos que já nos conhecem, pois somos uma banda muito recente ainda, cantando as músicas.

Nosso som http://www.myspace.com/juannabarbera tem nuances de psicodelia e guitarras altas, temos também músicas que saem mais pro sambinha, pro suingue, mas nesse dia o show foi mais porrada. No palco, como um resultado natural de nossas influências e intenções, dialogamos com performance, teatro, poesia e nonsense. Pra muitos somos BGs, ou bicho grilos, filhos diretos dos Novos Baianos e dos Mutantes, mas quem nos dera sermos tudo isso, somos apenas uma banda descobrindo sua identidade. Vai saber.

Me lembrei agora duma viagem, com uma galera pra Recife, e uma senhora nos perguntando dentro do ônibus de linha.
_Ei, vocês são hippies ? - e nós, aproveitando o ensejo que a época permitia, respondemos.
_ Sim, somos “Hippies” of Tradition.
Outra vez, na Rodoviária de Brasíliia, uma mãe diz pro filho, apontando pra nós.
_ Ta vendo meu filho, estuda, senão vai ficar igual a esses moços.
Durante o transcorrer da noite, eu entorpecido de música, extasiado com a festa, hoje recordo de que uns saíram rindo até as orelhas do coroa maluco e outros se sentiram ofendidos de terem de ouvir esporro num show.

Depois veio o show delicado eu diria, sutil e bem arranjado do Los Porongas, uma banda sincera, com um som de apelo radiofônico, porém com muita identidade. Eles, como os Porcas, também não querem enganar ninguém. São uma banda de rock muito boa, e deixam claro o que querem como proposta. Olhei pro palco e imaginei toda a selva amazônica e a imensidão do Brasil, e pensei :
_ Putz, esses caras sempre estiveram lá, no Acre porra !!!

Nessa hora me senti muito contente pensando que depois viria Vanguart, uma banda que desafiaria qualquer prognóstico a uns anos atrás. Vinda de Cuyabá, Mato Grosso, Pantanal, fazendo rock folk em inglês. Instalou-se no ambiente um clima de festa e contentamento. Era bom ver o Vanguart, era o que todos queriam, uma banda no auge, lançando seu primeiro disco e numa maturidade de criação e técnica. As músicas executadas com muita precisão e tão boas quanto no disco, senão melhores ao vivo, como Hey! Yo Silver, que me pareceu mais porrada.
Depois, Porcas.
“Eu sinto muito, mas eu não sinto nada”, é uma das músicas mais fantásticas que já ouvi. E uma batida de pandeiro que não desgruda da cuca.

“... a ponta dos meus dedos
percorrendo na superfície d’água
as letras do teu nome ... “

Ou algo mais ou menos assim. Na primeira vez que ouvi isso, fui embora com um calor no peito, muitas imagens me vieram a cabeça, um tanque cheio d’água onde eu brincava quando moleque, e, engraçado, a lembrança duma senhora que me olhava quando tinha uns cinco anos de idade.

No show final, a apoteose do rock, que tinha sido a noite, se concluía nas mãos de um de seus experientes aríates, Daniel Belleza com suas calças de couro e seu espetáculo visual e lascivo. A androginia e a sedução à serviço do rock e das guitarras altas. Já rouco, eu cantava “...aonde estão as flores da sua cabeça...“?

Adiante, essas linhas seriam poucas para descreverem tanta música, tantos papos, tantas pessoas, sorrisos, durante os três dias que só estavam, pra todos ali na sexta, começando.
Times New Roman que era poema e se tornou canção, está aqui num vídeo http://www.youtube.com/watch?v=Qrg1GEgFrSs gravado num show em maio deste ano no Arte na Praça, onde no domingo 16 de setembro, os Móveis Coloniais de Acajú destruíram tudo.
De quebra, escrevendo este texto, e pesquisando na net, descobri uma banda, que se chama New Times Roman (foto acima).

... e que se foda ...

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Um comentário:

Muryel De Zôppa disse...

estive lá, vi, li, e pouco entendi, graças a Deus!